Sofro de complexo de caramujo e tenho uma tendência insuportável de carregar meu armário comigo. Portanto, se há uma tarefa na corrida de montanha que me deixa tensa é arrumar a mochila de prova. Tenho sempre que resistir à tentação de incluir aquele algo a mais que, na minha mente perturbada, parece ser absolutamente essencial. Parece, mas nunca é.
Já corri provas de todas as distâncias na montanha e até cruzei da Argentina para o Chile – e vice-versa – pela Cordilheira dos Andes em três oportunidades. A primeira vez que atravessei a Cordilheira saí de Pucón (Chile) para, 126 km e três dias depois, chegar em Junin de Los Andes, já em território argentino. Minha mochila pesava absurdos 5,5 kg. Passei uma semana com uma baita dor nos ombros e na lombar. Carreguei um mundo de inutilidades.
Cinco anos após essa prova, eu aprendi a correr com a mochila bem mais leve e, no momento de arrumá-la, sempre opto pela bem-vinda prática do desapego. E quem me ensinou isso foi Rafael Campos, atleta e diretor técnico do Circuito KTR, que dá algumas dicas de como selecionar o que é essencial carregar em sua mochila e em que ordem.
O primeiro passo é colocar lado a lado todos os itens sobre em uma superfície: géis, balas de carboidrato, castanhas, sanduíches, suplementos, casacos, protetor solar, material obrigatório de segurança e trekking poles.
Tudo o que está na sua frente é ABSOLUTAMENTE necessário? Responda com sinceridade e descarte o que não for. Olhando desta forma fica muito mais fácil retirar o que é inútil. Lembre-se que após 8 horas de prova um casaco de 20 gramas parece pesar 2 kg.
A segunda tarefa é encher e colocar a bolsa d’água. “Para que ela demore mais a esquentar em razão do contato próximo com o corpo, você pode embrulhá-la em papel de alumínio ou em um cobertor térmico”, explica Rafael Campos.
No fundo da mochila devem ser depositados os equipamentos que você terá menor probabilidade de usar: bivac, kit de primeiros socorros, cobertor térmico, fleece ou segunda pele, anorak ou corta-vento, tudo preferencialmente acondicionado em sacos stank para proteção em caso de chuva.
Na sequência, é hora de colocar a comida que, estando logo no topo da mochila, poderá ser facilmente acessada. Você também pode espalhá-la pelos bolsos se houver essa opção.
“Vale levar em uma das garrafas de peito um isotônico para intercalar com a água e repor os minerais perdidos”, sugere Rafa Campos.
E se você, como eu, costuma correr na montanha em dupla, explique ao seu parceiro onde cada item pode ser encontrado. Fica mais fácil na hora de pedir para ele pegar aquela barra de proteína ou saquinho com castanhas de caju.
Praticar o desapego na hora de arrumar a mochila é uma arte, mas funciona.